Ao cidadão interessa saúde de qualidade – pública ou privada

A capacidade de mobilização e transformação posta em movimento pela pandemia trouxe ganhos muito importantes para nossa sociedade em diferentes áreas. Em relação ao Sistema Único de Saúde (SUS), as virtudes dessa capacidade ficaram muito claras – sem elas, nossa resiliência teria em grande parte falhado. Mas isso não é o suficiente para imaginarmos que estamos voando em céu de brigadeiro nas questões de saúde do nosso país – muito pelo contrário.

Para prosperar no “novo normal”, a sociedade precisa fazer mudanças mais fundamentais. Isso porque, se não mudarem os modelos de gestão, o conceito da qualidade e a forma de encarar a pesquisa e as mentalidades, a iniquidade, a injustiça e a falta de sustentabilidade, já inaceitáveis no ponto em que se encontram hoje em nosso país, em breve ficarão ainda mais patentes.

O que precisamos no clima incerto de hoje é de uma verdadeira transformação. É o único caminho para elevar o desempenho de acesso, o conceito da sustentabilidade, para construir capacidades e mudar a cultura de maneiras que não apenas ajudarão a sociedade a superar esta crise global de saúde, mas também a sustentarão nos próximos anos.

O Brasil tem 13% dos serviços de saúde terceirizados; dessa parcela, 73% são administrados pelo setor privado – em grande parte no modelo de organizações sociais, mas também por organizações sem fins lucrativos e em menor escala, pela iniciativa privada com fins lucrativos.

Mas, afinal o que quer o cidadão? Ele deseja ser atendido, ver seu problema resolvido com segurança, dentro de um prazo adequado e segundo determinados padrões de qualidade. Aliás na opinião dele, que é o grande interessado, tanto faz se quem presta o serviço é do setor público ou do privado: o que importa é que o atendimento contemple tais prerrogativas.

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Falta de qualidade é algo que não passa despercebido pelo brasileiro. Pesquisa Datafolha de agosto deste ano mostra que a área de atuação em que o governo federal mais deixa a desejar é justamente a Saúde – citada por 18% dos entrevistados (2.878 pessoas em 175 municípios brasileiros). Mesmo Educação e Desemprego (cada um com 15% das menções) ficam atrás.

A defesa de um modelo de contratação comparado com outro tem sido muito mais uma batalha com o sanitarismo. Aliás, cabe aqui uma grande defesa desta linha de pensamento: foi graças a ela que pudemos construir o nosso SUS, que merece todo o respeito. Mas, nos últimos 30 anos, muita coisa mudou. A expectativa de vida aumentou em mais de 20 anos graças à tecnologia e à necessidade de recursos físicos e de capitais humano e financeiro – e obter ambos, aliás, vem sendo um desafio enorme. Isto criou uma complexidade processual enorme, que exige agilidade e competitividade – e que o mundo privado e o liberalismo conseguem oferecer com benefícios ao cidadão.

É falso o conceito de que na saúde não existe lucro. Fosse assim, todos trabalhariam de graça e a indústria não seria uma grande fornecedora nesse processo. A defesa de quem tem na prestação de serviços de saúde seu modo de ganhar a vida deve e merece ser feita – dentro, claro, da necessidade do cidadão.

O governo propôs uma medida que visava buscar capital para que fosse possível tirar do papel, ou mesmo concluir, algo que é importante nesta rede de proteção social. É sabida a necessidade de investimento na área de saúde. É verdade que se poderia ter conversado um pouco mais, para que se criasse um ambiente político favorável. A meu ver, no entanto, não houve erro do governo, que colocou o paciente acima de qualquer influência.

A propósito, isso não é novo: fora do Brasil, esta convergência de papéis faz parte da rotina dos sistemas de saúde mais maduros. Ela está presente inclusive em países onde o financiamento é predominantemente público, como em grande parte do continente europeu.

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By Natasha Figueredo

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